Crianças latino-americanas sofrem mais com a pobreza, diz Banco Mundial

Criança e avó no interior do Rio Grande do Norte. Foto: Mariana Ceratti/Banco Mundial
Foto: Mariana Ceratti

Publicado Originalmente: 29/06/2016

Uma criança que nasce em um lar pobre tende a sair em desvantagem na corrida pelos melhores postos de trabalho quando adulta — justamente os empregos que poderiam ajudá-la a sair da pobreza. Ela tem menos acesso à educação, corre maior risco de sofrer de desnutrição e, portanto, também pode ficar doente com mais frequência.

Como se não bastasse, o percentual de crianças latino-americanas vivendo abaixo da linha de pobreza (4 dólares/dia) é duas vezes maior que entre os adultos: 36% e 19%, respectivamente. Os dados são de 2014 e vêm do Laboratório contra a Pobreza na América Latina (LAC Equity Lab/Banco Mundial), uma plataforma pública de compartilhamento de dados, indicadores e análises sobre pobreza, desigualdade e prosperidade.

“A pobreza infantil de hoje tem consequências importantes para o futuro da região”, avalia o economista Oscar Calvo-González, do Banco Mundial.

Ele aponta duas possíveis causas para o problema. Uma delas está nos índices de fecundidade da América Latina. Embora eles tenham diminuído nas últimas três décadas, ainda se mantêm mais altos nos lares mais pobres e especialmente entre as adolescentes. De fato, desde a década de 1990, as adolescentes tiveram a menor queda na fecundidade.

O fenômeno se torna mais grave quando se comparam os 20% mais pobres da população com os 20% imediatamente superiores: o índice de fecundidade do primeiro grupo, embora tenha começado a diminuir na última década, ainda é o dobro do segundo.

É possível que as medições de pobreza feitas entre os economistas também ponham as crianças em desvantagem. A pobreza infantil é calculada dividindo-se a renda do domicilio uniformemente entre todos os membros. Naturalmente, em casas com um maior número de crianças, a renda será dividida entre mais pessoas que não trabalham, o que talvez ajude a explicar as diferenças entre a pobreza infantil e a dos adultos.

“Uma limitação óbvia desse método para medir a pobreza é que ele requer assumir hipóteses sobre como se distribui o consumo dentro do lar. É possível que os adultos sacrifiquem seu próprio consumo para proteger as crianças, e então elas seriam menos pobres do que o cálculo sugere”, pondera Oscar Calvo-González.

Independentemente do motivo, o dado é um alerta para que os governos da região dediquem mais recursos e políticas aos latino-americanos de até 14 anos. Sem isso, não só as crianças terão menos chances de vencer a pobreza, perpetuando o ciclo já vivido por seus pais e avós, como também as economias da região seguirão tendo dificuldades.

FONTE: ONU

Brasil tem a nona maior taxa de homicídios das Américas, alerta OMS

Silhuetas de corpos desenhadas no Rio alertam para assassinatos de jovens negros. Foto: EBC
Foto: EBC

Publicado Originalmente: 27/06/2016

O Brasil tem a nona maior taxa de homicídio da região das Américas, com um indicador de 32,4 mortes para cada 100 mil habitantes, de acordo com relatório publicado em meados de maio (19) pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

A situação do Brasil é pior do que de países como Haiti (26,6), México (22) e Equador (13,8), cujas taxas de homicídio, apesar de altas, são inferiores às brasileiras. O Brasil só perde para países como Honduras (103,9), Venezuela (57,6), Colômbia (43,9) e Guatemala (39,9).

O Canadá tem as menores taxas de assassinatos nas Américas, com um indicador de 1,8 homicídio para cada 100 mil pessoas. Outros países no topo da lista entre as menores taxas incluem Chile (4,6), Cuba (5), Estados Unidos (5,4), Argentina (6) e Uruguai (7,9).

Segundo a OMS, homicídios respondem por cerca de 10% das mortes globais. Em 2012, houve estimados 475 mil assassinatos no mundo, sendo que 80% das vítimas são homens, e 65% homens com idade entre 15 e 49 anos.

A região das Américas teve a maior taxa de homicídios (19,4 a cada 100 mil) do mundo, sendo que os países de baixa e média renda, esse indicador atingiu uma média de 28,5 a cada 100 mil habitantes. A região do Oeste do Pacífico, que inclui países como Austrália, teve a menor taxa global (2 a cada 100 mil).

De acordo com a agência da ONU, um dos principais impulsionadores das taxas de assassinato no mundo é o acesso a armas, com aproximadamente metade de todos os homicídios cometidos com armas de fogo. Entre as mulheres, os homicídios por parceiros respondem por quase 38% de todos os assassinatos comparados a 6% de todos os assassinatos entre homens.

Taxas de homicídios globais

Durante o período de 2000 a 2012, houve um destacado declínio nas taxas de homicídio globais, com uma queda estimada de cerca de 17% (de 8 para 6,7 a cada 100 mil), e de 39% no caso dos países de alta renda (de 6,2 para 3,8 a cada 100 mil).

Na Europa, as taxas de homicídio caíram para mais da metade desde 2000. Em outras regiões, declínios modestos foram observados com exceção da região das Américas, onde as taxas permaneceram altas, disse a agência da ONU.

A prevalência dos assassinatos cometidos por parceiros é substancialmente alta na região africana, no Leste do Mediterrâneo e na região do Sudeste da Ásia, comparadas a outras regiões do mundo, mas apenas metade dos países dessas regiões está adotando estratégias sociais e culturais para resolver o problema da violência sexual, disse a OMS.

Segundo a agência das Nações Unidas, o homicídio e a maioria das demais formas de violência estão fortemente associados a determinantes sociais como desigualdade de gênero, pobreza e desemprego, assim como outros fatores de risco como fácil acesso a álcool e armas.

Os dados fazem parte do relatório “Estatísticas Globais de Saúde: Monitorando a Saúde para os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável)”, publicado pela OMS em maio e que também apontou um aumento significativo da expectativa de vida global desde 2000.

O documento mostrou que entre 2000 e 2015, a expectativa de vida aumentou cinco anos globalmente, evolução mais rápida desde a década de 1960. No entanto, a evolução foi desigual entre os países.

Em 12 países do mundo a expectativa de vida superava os 82 anos em 2015: Suíça (83,4 anos), Espanha (82,8), Itália (82,7), Islândia (82,7), Israel (82,5), França (82,4), Suécia (82,4), Japão (83,7), Cingapura (83,1), Austrália (82,8), Coreia do Sul (82,3) e Canadá (82,2).

Do lado oposto, os 22 países com expectativa de vida de menos de 60 anos eram todos da África Subsaariana, entre os quais Serra Leoa (50,1 anos), Angola (52,4), República Centro-Africana (52,5), Chade (53,1), Costa do Marfim (53,3), Lesoto (53,7) e Nigéria (54,5).

Clique aqui para acessar o relatório (em inglês).

FONTE: ONU

Genocídio de Ruanda: o relato de Josephine

Publicado Originalmente: 06/07/016

FONTE: ONU

United Nations report: Internet access is a human right

Publicado Originalmente: 03/06/2011

Internet access is a human right, according to a United Nations report released on Friday.

“Given that the Internet has become an indispensable tool for realizing a range of human rights, combating inequality, and accelerating development and human progress, ensuring universal access to the Internet should be a priority for all states,” said the report from Frank La Rue, a special rapporteur to the United Nations, who wrote the document “on the promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression.”

La Rue said in his report that access to the Internet is particularly important during times of political unrest, as demonstrated by the recent “Arab Spring” uprisings in Tunisia and Egypt, among other countries.

The report notes that while the Internet has been in existence since the 1960s, it is the way people now use the Internet, across the world and across age groups, with “incorporation into virtually every aspect of modern human life,” that makes the Internet an unprecedented force.

DOCUMENT: Read the United Nations report

“According to the International Telecommunication Union, the total number of Internet users worldwide is now over 2 billion,” the report said, also pointing out the huge growth in the number of active users on Facebook, which has surged from 150 million in 2009 to 600 million this year.

La Rue also urges governments to eschew laws that allow for people’s access to the Internet to be blocked.

La Rue describes the Internet as “revolutionary” and unlike any other communication medium such as radio, television or printed publications, which are “based on one-way transmission of information.”

The Internet, on the other hand, is an “interactive medium” that allows not only for the sharing of information, but also “collaboration in the creation of content,” which makes people “no longer passive recipients, but also active publishers of information.”

As such, the Internet can be a tool of empowerment and aid in the protection of and access to other human rights — as well as contributing to growth economically, socially and politically — benefiting mankind as a whole.

But while La Rue argues that Internet access is a basic human right, he also notes that giving people that right isn’t yet always feasible in every nation. But that shouldn’t stop governments from trying to give their people affordable access to the Web.

FONTE: Los Angeles Time

Graves ataques à sociedade civil em 2015

VI Jornada Cubana Contra a Homofobia, em Ciego Ávila,PascalleAvileño. As pessoas LGBTI pertencem aos grupos da sociedade civil mais vulneráveis a ataques em diferentes países. Foto: Jorge LuisBaños/IPS
Jornada Cubana Contra Homofobia – Foto: Jorge LuisBaños/IPS

Publicado Originalmente: 29/06/2016

Nações Unidas, 29/6/2016 – “A liberdade de expressão, de associação e de reunião pacífica da sociedade civil foram alvo de ataques em 109 países em 2015”, afirmou Mandeep Tiwana, diretor de política e análise da Civicus, por ocasião de uma entrevista coletiva realizada no dia 27, quando a rede que agrupa várias organizações não governamentais apresentou seu informe Estado da Sociedade Civil.

As organizações da sociedade civil são entidades fora da órbita de governos e empresas, que representam os interesses dos cidadãos e das cidadãs. Frequentemente seu propósito é impulsionar os direitos das pessoas desfavorecidas, como lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, intersexuais (LGBTI), deficientes e indígenas. Esses grupos são vulneráveis, mesmo quando trabalham em coordenação com organizações sociais.

“Uma das principais avaliações do grau de justiça dentro de uma sociedade é como esta trata suas minorias, seja em matéria de igualdade de oportunidades para todos, e em particular para os setores mais desfavorecidos”, explicou Tiwana. “Nessa avaliação,verificamos que muitas de nossas sociedades falham”, acrescentou.

Segundo o documento da Civicus, “em godo o mundo as pessoas ficam atrasadas em questões de gênero, etnia, situação migratória, religião, idade, sexualidade, deficiência, estado de saúde, HIV, localidade e muito mais”, detalhou Tiwana.

O representante da Civicus identificou os indígenas como o setor que foi especialmente alvo de ataques em 2015. “Defensores dos direitos indígenas que lutam contra as atividades das mineradoras e do grande setor agroindustrial, muitas delas relacionadas com as elites políticas, sofreram duros ataques e em alguns casos foram assassinados”, ressaltou Tiwana

As organizações LGBTI também costumam ser alvo comum de ataques. Qamar Nasim, da organização Blue Veins (Veias Azuis), do Paquistão, descreveu como aumentou o risco que sofrem as pessoas transgênero em seu país, desde que foi criada uma associação para trabalhar em defesa dos direitos de mais de 40 mil transgêneros.

“Quando essas pessoas começaram a defender seus direitos, imediatamente sofreram ataques porque estão em uma sociedade que não gosta que quem é trans reclame seus direitos”, pontuou Nasim, acrescentando que três integrantes da diretoria da associação foram assassinados, inclusive um morreu porque no hospital teve negada assistência devido à sua identidade de gênero.

Entretanto, o trabalho coletivo das pessoas transgênero no Paquistão deu resultados positivos. Graças ao seu esforço, o governo destinou, pela primeira vez, fundos para o bem-estar e a proteção desse grupo vulnerável da população. “Exatamente no dia 26 houve uma mobilização em massa”, contou Nasim. “A junta da sharia (lei islâmica) emitiu uma fatwa (edital religioso) que permite à comunidade transgênero contrair matrimônio, algo que antes era considerado um crime”, acrescentou.

Por sua vez, Kene Esom, da organização Homens por Direitos e Saúde Sexual, apontou que o valioso trabalho das organizações da sociedade civil também esteve em risco devido à falta de dinheiro. “Apesar do enorme investimento para acabar com a aids e enfrentar a epidemia de HIV, é muito pouco o dinheiro que vai para as mãos das organizações da sociedade civil”, lamentou.

Nasim expressou preocupação porque várias agências da Organização das Nações Unidas (ONU), incluídas as que trabalham com refugiados no Paquistão, não atenderam as necessidades das pessoas transgênero, e que essa situação motivou uma campanha chamada “basta de cegueira de gênero na ONU”.

Esom também demonstrou apreensão pelo fato de o apoio às pessoas LGBT na sede das agências da ONU não chegarem à prática nos países. “Os representantes dos países parecem ter grandes dúvidas na hora de falar contra a discriminação baseada na identidade sexual e de gênero, em particular na África, por variadas razões, e creio que ali devemos concentrar a solidariedade”, destacou Nasim.

Tiwana reconheceu que a ONU e a sociedade civil conseguiram impulsionar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), mas também que “os esforços realizados nos círculos de decisão não se espalharam para as bases”.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, reafirmou os compromisso com os ODS. E na cidade russa de São Petersburgo, no começo deste mês, também se mostrou muito preocupado pelas “crescentes pressões que sofre a sociedade civil em todas as partes. Quando as organizações sociais podem realizar seu trabalho, toda a sociedade se beneficia”, ressaltou Ban.

Farhan Haq, porta-voz do secretário-geral, afirmou à IPS que “as autoridades da ONU fazem todo o possível para encaminhar seu compromisso de proteger os direitos e o bem-estar das pessoas LGBTI em todo o sistema das Nações Unidas”. E acrescentou que “Ban Ki-moon escreveu para todas as autoridades do fórum mundial insistindo em que, no âmbito trabalhista da ONU, foi totalmente inclusivo e receptor de colegas LGBTI, deixando claro que toda expressão de homofobia ou transfobia é inaceitável”.

FONTE: Envolverde

Síria: ‘O genocídio ocorreu e está em curso’, diz comissão da ONU sobre yazidis atacados pelo ISIL

Uma menina yazidi, parte de uma minoria étnica no Iraque. Eles são alguns dos mais vulneráveis entre as milhões de pessoas afetadas pelo conflito. Foto: UNICEF Iraque/Wathiq Khuzaie
Menina yazidi, parte de uma minoria étnica no Iraque. Eles são alguns dos mais vulneráveis entre as milhões de pessoas afetadas pelo conflito. FONTE: UNICEF Iraque/Wathiq Khuzale

Publicado Originalmente: 18/06/016

Em pelo menos cinco províncias da Síria, meninas e mulheres são oferecidas e vendidas em mercados de escravos; as que tentaram escapar foram punidas com espancamentos e, em alguns casos, estupros coletivos. Além dos assassinatos e torturas, o grupo terrorista impõe transferências forçadas e conversão religiosa que minam a identidade do grupo e impõe “condições de vida que provocam uma morte lenta”.

O relatório foi apresentado nesta semana pela Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria, presidida pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro. As conclusões do documento são baseadas em entrevistas com sobreviventes, líderes religiosos, contrabandistas, ativistas, advogados, pessoal médico e jornalistas, bem como extenso material documental.

O Estado Islâmico do Iraque e Al-Sham (ISIS) – grupo terrorista também conhecido como ISIL ou Da’esh – está cometendo genocídio contra a minoria yazidi, constituindo-se em crimes contra a humanidade e crimes de guerra, disse na quinta-feira (16) uma comissão de investigação da ONU sobre a Síria.

“O genocídio ocorreu e está em curso”, disse o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, presidente da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria, ao divulgar relatório em Genebra sobre o tema.

“O ISIL submeteu cada mulher, criança ou homem yazidi que capturou às mais terríveis atrocidades”, disse Pinheiro no comunicado de imprensa emitido pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). O documento é intitulado “’Eles vieram para destruir’: os crimes do ISIL contra os yazidis” (acesse aqui).

O mandato da Comissão permite que o relatório trate apenas das violações cometidas contra yazidis dentro da Síria. Neste país, milhares de mulheres e meninas ainda estão sendo mantidas em cativeiro e sofrendo diversas violações aos direitos humanos – muitas vezes como escravas.

A Comissão examinou também a forma como o grupo terrorista transferiu à força yazidis para a Síria depois de promover ataques na região de Sinjar, no norte do Iraque, no início de agosto de 2014. A informação recolhida pela Comissão tornou evidente a intenção e responsabilidade penal dos comandantes militares, combatentes, líderes religiosos e líderes ideológicos do ISIL, disse a Comissão.

As conclusões são baseadas em entrevistas com sobreviventes, líderes religiosos, contrabandistas, ativistas, advogados, pessoal médico e jornalistas, bem como extenso material documental, que corroboram as informações recolhidas pela Comissão.

“O ISIL tem procurado apagar os yazidis através de assassinatos; escravidão sexual; escravidão; tortura e tratamentos desumanos e degradantes; transferência forçada, causando sérios danos físicos e mentais; imposição de condições de vida que provocam uma morte lenta”, descreveu o relatório.

A publicação acrescenta outras atrocidades do grupo terrorista: “Imposição de medidas destinadas a evitar que as crianças yazidis nasçam, incluindo a conversão forçada de adultos; a separação de homens e mulheres yazidis e o trauma mental; e a transferência de crianças yazidis de suas famílias, tornando-as combatentes do ISIL, os separando das crenças e práticas da sua própria comunidade religiosa”.

O ISIL tem separado homens e meninos yazidis com idade superior a 12 anos de suas famílias, assassinando aqueles que se recusaram a se converter, a fim de destruir sua identidade como yazidis. As mulheres e as crianças muitas vezes testemunham esses assassinatos antes de serem transferidas à força para locais no Iraque e, posteriormente, para a Síria, onde a maioria dos prisioneiros permanece, concluiu a Comissão.

Estupros coletivos e espancamentos documentados

Milhares de mulheres e meninas, algumas com apenas 9 anos de idade, foram vendidas em mercados de escravos nas províncias sírias de Raqqah, Alepo, Homs, Hasakah e Dayr AZ- Zawr. O ISIL e seus combatentes as mantêm na escravidão – incluindo a escravidão sexual, mas não apenas –, diz o relatório, com as mulheres e meninas yazidis sendo constantemente vendidas, doadas ou desejadas entre os combatentes.

“As sobreviventes que escaparam do cativeiro do ISIL na Síria descrevem como elas suportaram estupros brutais, muitas vezes diariamente, e foram punidas ao tentaram escapar com espancamentos graves, e às vezes estupros coletivos”, disse Vitit Muntarbhorn, um dos integrantes da Comissão da ONU.

A Comissão ouviu também relatos sobre como algumas mulheres e meninas yazidis se suicidaram após escapar das atrocidades.

O relatório observou que o ISIL, que considera os yazidis “infiéis”, citou publicamente a fé dos yazidis como base para o ataque do dia 3 de agosto de 2014, e para posteriormente abusar deles.

A Comissão disse que o ISIL referiu-se ao yazidi como uma “minoria pagã [cuja] existência […] os muçulmanos devem questionar”, acrescentando que “as suas mulheres podiam ser escravizadas […] como espólios de guerra”.

“O ISIL não fez segredo sobre sua intenção de destruir os yazidis de Sinjar, e que é um dos elementos que nos permitiram concluir que suas ações correspondem a um genocídio”, disse uma outra integrante da Comissão, Carla del Ponte.

Comissão pede que crimes sejam levados a tribunal

Pinheiro ressaltou que não deve haver impunidade para crimes dessa natureza, recordando as obrigações dos países sob a Convenção do Genocídio de prevenir e punir o genocídio.

A Comissão reiterou o seu apelo ao Conselho de Segurança para levar “urgentemente” a situação na Síria ao Tribunal Penal Internacional, ou para estabelecer um tribunal ad hoc para julgar as violações do direito internacional cometidas durante o conflito armado não internacional.

A Comissão observou ainda que, sem opções na justiça penal internacional, é provável que os julgamentos de crimes do ISIL contra os yazidis ocorram na jurisdição interna. É essencial que os países promulguem leis contra o genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra, acrescentou a Comissão.

A Comissão pediu ainda o reconhecimento internacional do genocídio, e disse que mais precisa ser feito para garantir a proteção da minoria religiosa yazidi no Oriente Médio, bem como o financiamento de atenção especial, incluindo apoio psicossocial e financeiro, para as vítimas do genocídio.

Além de Pinheiro, del Ponte e Muntarbhorn, a Comissão também é composta por Karen Koning AbuZayd, que também é assessora especial da ONU para a Cúpula de setembro que tratará dos grandes movimentos de refugiados e migrantes.

A Comissão de Inquérito da Síria recebeu o mandato do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em março de 2011, com o objetivo de investigar e registrar todas as violações do direito internacional na Síria. Por esse motivo, o grupo não tratou, no relatório, de outras violações contra os yazidis, como os ocorridos no Iraque.

FONTE: ONU

Ser mulher em um sistema prisional feito por e para homens

20160623 Caramante Mulheres presas

Publicada Originalmente: 23/06/2016

Apesar de corresponder a 6,4% da população carcerária no país, as mulheres têm se tornando mais numerosas entre as pessoas detidas. Segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), a população carcerária feminina aumentou 567,4%, de 2000 ade 2014, enquanto a média de crescimento masculino, no mesmo período, foi de 220,20%.

Com 37.380 mulheres presas, o Brasil tem a quinta maior população carcerária feminina do mundo, ficando atrás de Estados Unidos (205.400 presas), China (103.766), Rússia (53.304) e Tailândia (44.751), seguindo uma tendência mundial de encarceramento em massa de mulheres, detidas principalmente sob acusação de tráfico de drogas. De acordo com o relatório World Female Imprisonment List, produzido pela Universidade de Londres, existem mais de 700 mil mulheres presas no mundo hoje.

Penitenciárias

A separação de estabelecimentos prisionais em masculinos e femininos no Brasil é prevista pela Lei de Execução Penal (lei 7.210/84). Contudo, ainda é possível encontrar presídios mistos espalhados no país.

Segundo o Infopen – Mulheres, cerca de 75% (1070) das 1.420 unidades prisionais brasileiras eram voltadas somente para homens; 17% (239) eram unidades mistas (com uma sala ou ala específica para mulheres em estabelecimento anteriormente masculino) e apenas 7% (103) eram destinadas exclusivamente a mulheres. O levantamento não obteve informações sobre 1% (8) das unidades prisionais.

“Não há política pública específica pra tratar dessas mulheres em presídios mistos, que muitas vezes acabam funcionando como simples extensão dos masculinos. Relatos de violência sexual nesses ambientes são comuns”, avalia Bruna Angotti, advogada e coordenadora do Núcleo de Pesquisas do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM).

Marcadores de gênero

Para Angotti, a mulher detida é vulnerabilizada desde o momento do flagrante até a condenação definitiva. “Para elas, a tensão sexual é um adicional, está sempre presente no ar. No limite, o estupro é sempre uma ameaça.”

Em casos de flagrante,  mulheres devem ser acompanhadas até a delegacia por policiais mulheres – regra que, segundo ela, não costuma ser respeitada. “É comum mulher ser levada no camburão por homens. Imagina você, sozinha, num carro com cinco outros homens, sendo levada para outro ambiente dominado por homens. Muitas mulheres ter contato com outras mulheres só na penitenciária”, afirma a pesquisadora.

Andrelina conheceu o cárcere a primeira vez aos 14 anos, quando fugiu de casa e foi morar na rua. No total, passou pela antiga Febem 12 vezes e chegou a ser detida três vezes quando era maior de idade. Segundo ela, a fila para o presídio feminino era “mínima” e composta majoritariamente por mães, irmãs e filhos. “Uma faxineira da prisão falava ‘se a condenação chegou, o amor acabou’. Marido quase não visita, só vai ver quando a mulher ainda está na provisória, quando acha que ela vai sair. Quando a condenação sai, não aparece mais”, conta.

Após cumprir a última pena, há vinte anos, Andrelina fundou o grupo “Mães do Cárcere”, na Baixada Santista, ONG que acompanha mulheres presas e familiares de detentos, fornece orientações e denuncia abusos de poder.

Ao conversar com mulheres cujos familiares estão detidos, Andrelina sente que há um receio por parte delas de serem julgadas. “Muitas vezes, essas mulheres têm medo de serem vistas pela comunidade e pela família como traidora ou vulgar. É difícil”.

Em sua visão, ainda há um preconceito sobre a mulher que muitas vezes a faz acompanhar o marido preso mesmo a contra-gosto. “A mulher não abandona o homem. Ela não pode faltar na visita, se não o homem já pensa que ela está traindo”, diz a presidenta da ONG. A ativista vê uma diferença no comportamento de mulheres e homens detidos. “A gente ainda não tem essa voz pra falar que o marido tem que ir lá ver a gente. Com o homem não tem essa. Ele manda recado por amigo, mãe e família”, completa.

A antropóloga Natália Lago ressalta a importância  de pensar as mulheres não só nos presídios femininos. Segundo ela, a primeira experiência de muitas detidas com o cárcere não ocorreu com a própria detenção, mas antes, a partir de pais, irmãos, filhos e esposos.

“Há muita mulher nos presídios em circulação, abastecendo as prisões com roupas, alimentos e outros produtos”. Além da infra-estrutura material, ela ressalta o trabalho afetivo feito pelas mulheres de acompanhar os familiares detidos. “O papel de cuidar construído para a mulher continua nas prisões”, afirma.

As visitas fazem uma diferença importante na experiência dessas mulheres, não só pelo impacto psicológico e emocional, mas também pelo acesso a produtos não oferecidos pelo presídio. Essa é a avaliação de irmã Margaret Gaffney, integrante da Pastoral Carcerária de São Paulo, que visita presídios femininos da capital paulista semanalmente.

“Não receber visitas é ficar sem o jumbo [pacote com produtos de limpeza, vestuário e alimentação enviados pelas famílias]. O que o presídio manda costuma não ser suficiente e as famílias é que dão essa assistência. Não é só absorvente”, diz Gaffney.

Outra situação se refere às visitas íntimas. Tanto na masculina como na feminina, é preciso solicitar autorização e apresentar documentos que comprovem a relação entre o(a) preso(a) e o(a) visitante. Enquanto as visitas íntimas para homens acontecia já na década de 1930, para mulheres isso foi reconhecido enquanto direito apenas em 1999.

Para Bruna Angotti, o cárcere não afeta só o direito de ir e vir, mas uma perda de autonomia e de outros direitos como o reprodutivo: “É a leitura de que o corpo feminino não é passivo de desejo e subjetividade. A  prisão está ali para aniquilar a potência feminina enquanto potência humana, inclusive a sexual”.

Um problema se refere à falta de padronização sobre as regras para as visitas íntimas nos presídios femininos. “Como não há uma padronização, cada lugar faz de um jeito. Em alguns presídios só a visita é mensal e outros que exigem horário marcado”, diz Bruna Angotti.

Na avaliação de Bruno Shimizu, defensor do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, há uma maior flexibilização da aplicação dessas regras nos presídios masculinos: “Se faz mais vista grossa com eles. Nas femininas, a fiscalização é seguida mais à risca. Já vi caso de uma detenta que recebeu falta grave por ter engravidado na prisão”, relata.

Em 2013, Roberta* permaneceu seis meses detida em regime fechado no Centro de Progressão Penitenciária de Franco da Rocha, na região metropolitana de São Paulo. Ela conta que, quando maridos iam visitar as esposas, as outras detidas saíam da cela e deixavam o casal a sós.

“Algum ruído já era entendido como desrespeito”, relata. Segundo ela, em situações como essa, a detida costumava ser encaminhada ao setor de disciplina e podia receber uma advertência ou até ser remanejada de cela. “É complicado porque tem um rodízio para dormir nas camas. Se mudar de cela, ela entra na fila de novo e espera mais tempo dormindo no chão”, conta Roberta.

A visita íntima só foi regulamentada para mulheres detidas em 1999. Para casais homoafetivos só em 2011, após a publicação de resolução pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), do Ministério da Justiça. A medida revogou a Resolução número 01/1999, que omitia os relacionamentos homoafetivos nas recomendações feitas sobre visitas íntimas.

Segundo Bruna Angotti, autora do livro “Entre as Leis da Ciência, do Estado e de Deus – o surgimento dos presídios no Brasil”, nas décadas de 1930 e 1940 eram comuns prisões sob acusações como vadiagem, escândalo e mendicância. No estado de São Paulo, em 1943, o “escândalo” foi o único “crime” em que o número de mulher (60) é superior ao de homens (48).

“Há um modelo de mulher a ser seguido e aquelas consideradas ‘desviantes’ são retiradas de circulação”. A pesquisadora vê uma semelhança entre as “bêbadas e escandalosas dos anos 40” e as mulheres detidas sob acusação de tráfico hoje. “Prender é definir quais comportamentos são aceitos na sociedade. Se restitui na cadeia o que é ser mulher e o dever ser feminino”.

Para ela, presídios femininos costumam trazer um ambiente infantilizado, com paredes e acessórios cor-de-rosa, o que não se vê nos masculinos. “É um ambiente pensado para docilizar a mulher”, avalia.

Em sua avaliação, o sistema carcerário reproduz o sexismo presente na sociedade extramuro. “Se a presa é mãe, é comum a pergunta ‘mas ela não pensou nos filhos antes de cometer o crime?` A mulher é julgada não só pelo crime que cometeu, mas também pelos papéis que foram socialmente atribuídos a ela”, afirma.

“Se a sociedade é machista, racista e homofóbica,o sistema de Justiça não é diferente. Produzimos diferenças e hierarquias o tempo todo aqui fora e nos presídios isso vale também. A prisão está no mundo”, diz a antropóloga Natália Lago.

FONTE: Ponte Jornalismo